sexta-feira, 25 de janeiro de 2013

MINHA DOCE VOZINHA




Não gostava daquela visita.
Era ela chegar e a conversa girava sempre em torno do mau gênio de minha avó. E tinha tantas histórias pra contar ... a preferida era aquela que num passeio em plena Lua de Mel, minha avó aborrecida atirou o chapéu longe e não desamarrou mais a cara até o final do passeio. 

Os anos se passaram.

Eu não esquecia aquelas histórias mas faltava coragem para falar com minha avó sobre elas. 

Então, uma tarde em que vovó estava particularmente falante, contando passagens de sua vida, tomei coragem e perguntei: "Vó que história é esta que a senhora jogou seu chapéu longe, enraivecida, quando passava lua de mel aqui no Rio de Janeiro.  É verdade isso ? "

- Foi o vento, disse ela.

E aos oitenta anos vovó contou com riqueza de detalhes, mas que aqui vou resumir, a seguinte história:

"Fiquei noiva aos 13 anos e me casei aos 16 anos. Durante este período nunca podia ficar à sós com meu noivo, ele ia visitar meu pai e ficavam horas conversando. A empregada ia me avisar "seu noivo chegou ..." e eu ficava namorando-o pelo buraco da fechadura, até meu pai dar ordem para eu entrar na sala e despedir-me dele. Casamos e viemos passar a Lua de Mel no Rio de Janeiro. 

Passando férias no Rio, havia um casal amigo que todos os dias, mal amanhecia e já estavam na portaria do Hotel nos chamando. Queria nos mostrar a Cidade. Éramos recém-casados e  queríamos ficar a sós. Não estávamos nem um pouco interessados em conhecer a cidade naquele momento. Eu pedia ao seu avô que agradecesse e dissesse que não íamos. Mas ele não tinha coragem, dizia que o casal era tão gentil, afinal haviam atravessado a cidade tão cedinho só para convidar-nos a passear e conhecer as delícias do Rio de Janeiro. 

Era tão cedo ... ventava muito ... carro aberto ... difícil segurar chapéu, cabelo, bolsa, assim tudo junto. Aborrecida com a ventania, cabelo nos olhos, resolvi soltar o chapéu que teimava em não parar no meu colo e ele foi atirado longe pelo vento".

Ahhhh ... minha doce e querida vozinha ...   Te entendo tão bem!

As delícias que vocês queriam eram bem outras. 

Se tivessem seguido seu coração e fossem menos educados, essa fama de mau gênio não teria atravessado gerações.








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